Se todos pudessem ter o que
quisessem na hora em que quisessem, não
haveria aquilo que chamamos de política. Há
concorrência, embates, fazemos concessões e, às vezes, temos de lutar pelas
coisas. Assim, desenvolvemos uma linguagem para explicar e justificar nossas
demandas e para desafiar, contradizer ou satisfazer as dos outros. Essa pode
ser uma linguagem de interesses, tanto de indivíduos quanto de grupos, ou pode
ser a linguagem de valores, tais como direitos e liberdades ou divisão igualitária e justiça. Mas no cerne da atividade
política, desde o seu começo, está o desenvolvimento de ideias e conceitos.
Essas ideias nos ajudam a estabelecer o que queremos e a defender nossos
interesses.
A vida política é em parte uma resposta necessária aos desafios da
vida cotidiana e o reconhecimento de que a ação coletiva é quase sempre melhor
que a individual. Mas outra tradição do pensamento político está associada ao
pensador grego Aristóteles, para quem a política não era apenas a luta para
satisfazer as necessidades materiais em condições de escassez. Com o advento de
sociedades complexas, surgiram outras questões. Quem deve governar? Que poder
devem ter os governantes políticos e como as exigências para legitimá-los podem
ser comparadas às outras fontes de autoridade, tais como a família ou as
autoridades religiosas?
A política é a nobre atividade na qual os homens decidem as
regras pelas quais viverão e os objetivos que querem buscar coletivamente.
Moralismo político
Aristóteles achava que não se deveria permitir a todos os
seres humanos a participação na atividade política: no seu sistema, as
mulheres, os escravos e os estrangeiros estavam excluídos do direito de
governarem a si mesmos e aos outros. Muitos pensadores e políticos desde o mundo antigo desenvolveram diferentes
ideias a respeito dos objetivos que a política poderia ou deveria atingir. Tal
abordagem é conhecida como moralismo político.
Para os moralistas, a vida
política é um ramo da ética — ou filosofia moral
— e assim não surpreende que haja tantos filósofos no grupo de pensadores
políticos moralistas. Eles argumentam que a política deveria ser direcionada à
conquista de objetivos relevantes, ou que os arranjos políticos deveriam ser
organizados para proteger certas questões.
Dentre elas, estão valores políticos tais como justiça, igualdade, liberdade,
felicidade, fraternidade ou autodeterminação nacional.
Alguns teóricos consideram o pensamento político utópico uma
iniciativa perigosa, já que, no passado, ele levou a justificativas da
violência totalitária.
Realismo
político
Outra tradição relevante de pensadores rejeita a ideia de que a
política existe para oferecer valores éticos ou morais, tais como felicidade ou
liberdade. Em vez disso, eles argumentam que a política tem a ver com o poder,
que é o meio pelo qual os fins são alcançados, os inimigos, derrotados, e as concessões, mantidas. Sem a habilidade de alcançar e exercer o
poder, os valores — a despeito de quão nobres possam ser — são inúteis.
O grupo de pensadores que
focam no poder em vez de na moralidade é
descrito como realistas. Eles concentram sua atenção no poder, no conflito, na
guerra, e são, em geral, cínicos a respeito das motivações humanas. Talvez os
dois maiores nesse grupo tenham sido o italiano Nicolau Maquiavel e o inglês
Thomas Hobbes, contemporâneos de períodos de guerra civil e desordem, nos
séculos XVI e XVII, respectivamente.
Conselho sábio
Ao lado dos filósofos políticos, há uma antiga tradição similar que é
pragmática e preocupada com o alcance dos melhores resultados possíveis. O
problema da guerra e do conflito jamais será erradicado, e argumentos a
respeito da relação entre os valores políticos como liberdade e igualdade
talvez nunca sejam resolvidos, mas talvez possamos progredir no desenvolvimento
constitucional, na determinação de políticas e na garantia de que os
governantes tenham a maior estabilidade possível.
Algumas das mais antigas ideias sobre política, tais como as do filósofo chinês
Confúcio, estão associadas às habilidades e virtudes de um conselheiro sábio.
O surgimento da ideologia
Outro tipo de pensamento
político é, com frequência, descrito como
ideológico. Eles
explicam como as ideias de cada período histórico diferem porque
as práticas e instituições das sociedades são diferentes, e o significado das
ideias muda com a história.
Platão e Aristóteles pensavam a democracia como um sistema
perigoso e corrupto, ao passo que a maioria das pessoas no mundo moderno a veem
como a melhor forma de governo. A escravidão já foi pensada como uma
condição natural que excluía muitos de qualquer direito, e, até o século XX, a
maioria das mulheres não era considerada cidadã.
Isso levanta a questão de quais seriam os motivos de algumas ideias, como a igualdade, terem se tomado importantes,
enquanto outras, como a escravidão e o direito divino dos reis, terem caído em
desuso.
O pensamento político ideológico também tem sido alvo de hostilidade e
crítica. Se as ideias fossem apenas um reflexo dos processos históricos,
argumentam os críticos, isso significaria que os indivíduos envolvidos nesses
processos desempenhariam essencialmente um papel passivo, e que a deliberação
racional e a argumentação teriam valor limitado. A luta ideológica pode ser
mais bem vista como uma competição entre times de futebol. A paixão, em vez da
razão, seria mais importante na escolha por um time, e a vitória, em última
instância, é o que conta. Muitos se preocupam que a política ideológica resulta
nos piores excessos do realismo, no qual os fins justificam meios brutais ou
injustos. A política ideológica parece ser uma luta perpétua, ou guerra, entre
campos rivais e irreconciliáveis.
A solução de Marx para esse problema seria o triunfo
revolucionário das classes trabalhadoras e a vitória tecnológica sobre a
escassez, o que resolveria o problema do conflito político. À luz do século XX,
tal abordagem da política parece ser, para muitos, um tanto quanto otimista, já
que a mudança revolucionária tem sido vista como a substituição de um tipo de
tirania por outro. Segundo essa visão, o marxismo e outras ideologias são
apenas a versão mais recente de um moralismo utópico irrealista.
Um futuro em disputa
Velhas ideias de soberania estatal têm um papel incômodo na nova
política mundial de soberania compartilhada, cooperação econômica e
globalização. O ponto de vista de Hegel parece muito pertinente aqui — não
podemos prever como os outros vão nos ver no futuro, nem se aquilo que nos
parece senso comum será visto como plausível para nossos descendentes.
Fazer com que o presente faça sentido exige um entendimento da variedade de ideias e
teorias políticas concebidas ao longo da história. Essas ideias servem como uma
explicação das possibilidades do presente, bem como uma advertência contra o
excesso de confiança em nossos próprios valores políticos, e nos lembram que as
exigências pela organização e governança da vida coletiva da sociedade mudam de
maneiras que não podemos prever com certeza. Conforme surgirem novas
possibilidades para o exercício do poder, também surgirão novas demandas pelo
seu controle e pela prestação de contas, e com elas virão novas ideias
políticas e teorias. A política tem a ver com todos nós, assim todos devemos
estar envolvidos nesse debate.
O pensamento político antigo
Pode-se dizer que a teoria
política se iniciou nas civilizações da China e
Grécia antigas. Em ambos os lugares, surgiram pensadores que questionaram e
analisaram o mundo ao seu redor de uma forma que hoje chamamos de filosofia. No começo, tanto na China como na
Grécia essas questões eram consideradas parte da filosofia moral ou ética. Os
filósofos examinaram como a sociedade deveria ser estruturada para garantir não
apenas a felicidade e a segurança das pessoas, mas para capacitá-las a uma
“vida digna”.
O
pensamento político na China
A partir de 770 a.C.,
aproximadamente, a China atravessou um tempo de prosperidade conhecido como o
período da Primavera e Outono, no qual várias
dinastias governaram diversos reinos de maneira relativamente pacífica. A
erudição era muito apreciada nesse período, resultando nas Cem Escolas de
Pensamento. De longe, o filósofo mais influente dessa época foi Confúcio, que
combinou moral e filosofia política em suas propostas para a manutenção dos
valores morais chineses num estado liderado por um governante virtuoso,
aconselhado por uma classe de administradores.
Sun
Tzu
No final do século VI a.C., a China havia chegado ao fim de uma era de
prosperidade pacífica — o período da Primavera e Outono — na qual floresceram
os filósofos. Muitas das ideias estavam focadas na filosofia moral ou ética, e
a filosofia política que se seguiu a isso se concentrou na forma moral correta
sob a qual o Estado deveria organizar seus assuntos internos. Isso culminou com
a integração por Confúcio das virtudes tradicionais numa hierarquia liderada
por um soberano e administrada por uma burocracia de eruditos.
Ao final do período da Primavera e Outono, no entanto, a estabilidade
política de vários estados da China se fragilizou, e as tensões entre eles aumentaram conforme a
população crescia. Os governantes tinham não só que
gerenciar seus assuntos internos, como também defender-se contra o ataque de
reinos vizinhos.
Estratégia militar
Nessa atmosfera, os
conselheiros militares se tornaram tão
importantes como os burocratas civis, e a estratégia militar começou a moldar o
pensamento político. A obra mais influente sobre esse assunto foi A arte da
guerra, que se acredita ter sido escrita por Sun Tzu, um general no exército do rei de Wu. A passagem inicial diz: "A arte
da guerra é de vital importância para o Estado. É uma questão de vida ou morte,
um caminho ou para a segurança ou para a ruína. Assim, ela é um assunto de
pesquisa que não deve, de maneira alguma, ser negligenciado". Isso marcou
uma ruptura na filosofia política da época, e a obra de Sun Tzu talvez tenha
sido a primeira declaração explícita de que a guerra e a inteligência militar
são elementos cruciais para os negócios do Estado.
A descrição detalhada de Sun Tzu sobre a arte da guerra tem sido
vista como a base de um arcabouço para a organização política em geral. Ele dá
uma lista dos "princípios de guerra" que devem ser considerados ao se
planejar uma campanha. Além das questões práticas, tais como o clima e o campo
de batalha, a lista inclui a influência moral do governante, a habilidade e as
qualidades do general e a organização e a disciplina dos homens. Implícita a
esses princípios de guerra está uma estrutura hierárquica encabeçada por um soberano, aconselhado
por e dando ordens aos seus generais, os quais lideram e organizam suas tropas.
Para Sun Tzu, o papel do
soberano ira garantir a liderança moral. O povo devia ser
convencido de que sua causa era justa antes de dar o seu apoio.
Como era de se esperar, Sun
Tzu enfatizava as qualidades do general, descrevendo-o como o "baluarte do
Estado". Seu treinamento e sua experiência
moldavam o conselho que dava ao soberano, determinando a política na prática,
além de ser vital para a organização do exército. A arte da guerra recomendava
que a disciplina fosse rigorosamente cumprida, com duras penas em caso de
desobediência, mas ela deveria ser amenizada com o uso constante de recompensas
e punições.
Saber quando lutar
Sun Tzu acreditava que o propósito do exército era
proteger o Estado e garantir o seu bem-estar, e que a guerra sempre deveria ser
a última instância. Um bom general deveria saber quando lutar e quando não
fazê-lo, lembrando que a resistência de um inimigo pode ser' com freqüência
quebrada sem um conflito armado. Um general deveria tentar, em primeiro lugar,
frustrar os planos do inimigo. Falhando nisso, ele deveria se defender contra
o ataque. Somente não tendo sucesso nisso deveria lançar uma
ofensiva.
Para evitar a necessidade
da guerra, Sun Tzu defendia a manutenção de
uma forte defesa e a formação de alianças com os Estados vizinhos. Já que uma
guerra cara era ruim para ambos os lados, em geral fazia sentido chegar a um
acordo pacífico.
Inteligência militar
Espiões garantiam informações vitais sobre as potenciais
intenções e capacidades do inimigo, permitindo aos generais no comando
aconselhar o governante sobre a possibilidade de vitória no conflito. Nesse
mesmo sentido, Sun Tzu explicou que o elemento mais importante a seguir em uma
guerra de informação é o engano.
Ao suprir o inimigo com
informações enganosas a respeito de suas defesas, por exemplo, prevenia-se a ocorrência de guerras.
Ele também advertia contra o que considerava a tolice de
destruir um inimigo na
batalha, já que isso diminuía a recompensa que poderia ser ganha com a vitória — tanto a boa vontade de qualquer
soldado derrotado quanto as riquezas de qualquer território conquistado.
Subjacente ao conselho prático da Arte da
guerra, está um alicerce cultural tradicional baseado em valores morais de justiça, adequação e moderação. O Estado exerce sua capacidade militar para
punir aqueles que lhe causam dano ou o ameaçam de
fora, assim como usa a lei para punir os criminosos locais.
Tornou-se leitura obrigatória em várias academias militares e aparece bastante na
bibliografia de cursos como política, negócios e economia.
A
democracia grega
Simultânea ao desenvolvimento na China, a civilização grega
florescia. Assim como na China, a Grécia não era uma única nação, mas várias
cidades-estado separadas sob diversos sistemas de governo. A maioria era
governada por um monarca ou uma aristocracia, mas Atenas estabeleceu uma forma
de democracia sob uma constituição apresentada pelo estadista Sólon em 594 a.C.
A cidade se tornou
o centro cultural da Grécia e proporcionava um espaço intelectual no
qual filósofos podiam refletir sobre qual seria o Estado ideal, qual seria seu
propósito e como ele deveria ser governado.
Depois de Aristóteles, a "era de ouro" da filosofia clássica
grega chegou ao fim quando Alexandre, o Grande, embarcou numa série de
campanhas para estender seu império a partir da Macedônia até o norte da África
e, através da Ásia, até o Himalaia. Mas na índia ele enfrentou a resistência de
uma oposição organizada.
O surgimento da cidade
Quando se afirma que os
gregos e romanos inventaram a política,
não se quer dizer que, antes deles, não existiam o poder e a autoridade, mas
que inventaram o poder e a autoridade políticos propriamente ditos, ou seja,
que desfizeram as características que havia anteriormente, de poder despótico
ou patriarcal exercido pelo chefe de família sobre um conjunto de famílias a
ele ligadas por laços de dependência econômica e militar, por alianças matrimoniais, numa relação pessoal em que o chefe garantia proteção e os
súditos ofereciam lealdade e obediência.
Embora, nos começos, gregos e romanos tivessem conhecido esse tipo de
organização, um conjunto de medidas foi tomado pelos primeiros dirigentes — os legisladores
— de modo a impedir a concentração dos poderes e da autoridade nas mãos de
um rei, senhor da terra, da justiça e das armas, representante da divindade.
Apesar das diferenças históricas na formação da Grécia e de Roma, há três
aspectos comuns a ambas e decisivos para a invenção da política. O primeiro é a
forma da propriedade da terra;
o segundo, o fenômeno da urbanização; e o terceiro, o modo
de divisão territorial das cidades.
Como a propriedade da terra
não pertencia à aldeia nem ao rei, mas às
famílias independentes, e como as guerras ampliavam o contingente de escravos,
formou-se na Grécia e em Roma uma camada pobre de camponeses que migraram para
as aldeias, ali se estabeleceram como artesãos e comerciantes, prosperaram,
transformaram as aldeias em centros urbanos e passaram a disputar o direito ao
poder com as grandes famílias agrárias.
Tanto para a expansão territorial como para a defesa de sua cidade, formando
as milícias dos nativos da comunidade. Essa participação
militar fazia com que todos se julgassem no direito de intervir, de algum modo,
nas decisões econômicas e legais de suas comunidades. A luta das classes pedia
uma solução. Essa solução foi a política, que transformou as comunidades urbanas em cidades propriamente ditas.
Em Atenas, por exemplo, a polis
foi subdividida em unidades sociopolíticas
denominadas demos; em Roma, em tibus.
No caso de Atenas, todos os
naturais do demos tinham o direito de participar diretamente do poder,
donde o regime ser uma democracia.
O regime político romano era, assim, uma oligarquia.
·
Oligarquia: regime político em que o poder é
exercido por um pequeno grupo de pessoas, pertencentes ao mesmo partido, classe
ou família
Os principais traços da invenção da política
Rompendo com o poder despótico, gregos e romanos inventaram o poder político
porque:
• separaram a autoridade pessoal privada do chefe de família — senhorio patriarcal e patrimonial — do poder impessoal público, pertencente
à coletividade; separaram o privado do público e impediram a identificação do
poder político com a pessoa do governante;
• separaram a autoridade militar do poder civil, subordinando a primeira ao segundo. Isso não significa que em certos casos, como em Esparta
e Roma, o poder político não fosse também um poder militar, mas sim que as
ações militares deviam ser, primeiro, discutidas e aprovadas pela autoridade
política (as assembleias, em Esparta; o Senado, em Roma) e só depois
realizadas;
• separaram a autoridade mágico-religiosa do poder temporal laico, impedindo tanto a divinização dos governantes quanto sua transformação
em sumos sacerdotes;
• criaram a ideia e a prática da lei como expressão de
uma vontade coletiva e pública, definidora dos direitos e deveres para todos os
cidadãos, impedindo que fosse confundida com a vontade pessoal de um
governante.
• lei e direito: Ao criarem a lei e o direito, gregos
e romanos afirmaram a diferença
entre o poder político e todos os
outros poderes e autoridades existentes na sociedade, pois conferiram a uma
instância impessoal e
coletiva o poder exclusivo ao uso da força
para punir crimes, reprimir revoltas e para vingar com a morte, em nome da
coletividade, um delito julgado intolerável
por ela. Em outras palavras, retiraram dos indivíduos
privados o direito de fazer justiça
com as próprias mãos e de vingar por si mesmos uma ofensa ou um
crime. O monopólio da força, da vingança
e da violência passou para o
Estado, sob a lei e o direito.
• criaram a instituição do erário público ou do fundo público, isto é, dos bens e recursos que pertencem à sociedade e são por ela
administrados por meio de taxas, impostos e tributos, impedindo a concentração da propriedade e da riqueza nas mãos dos dirigentes;
• criaram o espaço político ou espaço público — a
Assembleia grega e o Senado romano —, no qual os que possuíam direitos iguais
de cidadania discutiam suas opiniões, defendiam seus interesses, deliberavam em
conjunto e decidiam por meio do voto, podendo, também pelo voto, revogar uma
decisão tomada. É esse o coração da invenção política. De fato, a marca do
poder despótico eram a deliberação e a decisão a portas fechadas. A política,
ao contrário, introduz a prática da publicidade, a exigência de que a sociedade
seja informada, conheça as deliberações e participe da tomada de decisão.
O significado da invenção da política
Em lugar de reprimir os
conflitos pelo uso da força e da violência das armas, a política
aparece como trabalho legítimo dos conflitos, de tal modo que o fracasso nesse
trabalho é a causa do uso da força e da violência.
A democracia ateniense e as
oligarquias de Esparta e da República romana fundaram a
ideia e a prática da política na cultura ocidental.
Não devemos cair em anacronismos, supondo que gregos e
romanos instituíram uma sociedade e uma política cujos valores e princípios
fossem idênticos aos nossos.
Em primeiro lugar, a
economia era agrária e escravista, de sorte que uma parte da
sociedade — os escravos — estava excluída dos direitos políticos e da vida
política. Em segundo lugar, a sociedade era patriarcal e, consequentemente, as
mulheres também estavam excluídas da cidadania e da vida pública. A exclusão
atingia também os estrangeiros e os miseráveis.
A cidadania era exclusiva
dos homens adultos livres nascidos no território
da cidade. Além disso, a diferença de classe social nunca era apagada, mesmo que os pobres tivessem direitos políticos. Assim, para muitos cargos, o
pré-requisito da riqueza vigorava e havia mesmo atividades portadoras de prestígio que somente os ricos podiam realizar.
A invenção da política como solução e resposta que uma sociedade oferece para suas diferenças, seus conflitos e suas contradições.
A sociedade contra o Estado
Para regular os conflitos,
determinar limites às lutas, garantir que os ricos conservem
suas riquezas e os pobres aceitem sua pobreza, surge uma chefia que, como
vimos, pode tomar duas direções: ou o chefe se toma senhor das terras, das
armas e dos deuses e transforma sua vontade em lei, ou o poder é exercido por
uma parte da sociedade — os cidadãos —, por meio de práticas e instituições
públicas fundadas na lei e no direito como expressão da vontade coletiva.
Nos dois casos, surge o Estado
como poder separado da sociedade e encarregado de dirigi-la, comandá-la, arbitrar os conflitos e usar a força. Há, porém, um
terceiro caminho.
Sem dúvida, os conquistadores encontraram grandes impérios nas Américas: incas, astecas e maias.
Todavia, exceto por esses
impérios destruídos, os conquistadores
encontraram as demais nações americanas organizadas de maneira incompreensível
para os padrões europeus e por isso interpretaram o que eram incapazes de
compreender como inferioridade dos americanos. Considerando-os selvagens e bárbaros, justificavam a escravidão, a evangelização e o extermínio.
A visão europeia era e é etnocêntrica, ou seja, considera padrões, valores e práticas dos brancos adultos proprietários
europeus como se fossem os únicos válidos, superiores a todos os outros e devendo servir de modelo ou de padrão para todas as sociedades, porque seriam definidores da civilização.
• etnocentrismo: A palavra etnocentrismo é composta de etnos e centro. Etnos vem
do grego e significa "o conjunto de seres que possuem a mesma origem e os
mesmos traços", donde
designar nação, povo, raça. O etnocentrismo é a visão
de mundo daqueles que consideram sua etnia ou seu grupo étnico superior aos demais e mais importante
do que os outros.
Na perspectiva do etnocentrismo, os nativos americanos possuíam e possuem sociedades defeituosas nas quais falta o que é
importante: o mercado (moeda e comércio), a escrita (alfabética), a história e
o Estado. Eram e são, portanto, sociedades sem comércio, sem escrita,
sem memória e sem política.
Sociedades
contrárias ao comércio e ao Estado
Essas sociedades são tribais ou comunais. Nelas, não há propriedade privada
da terra e das riquezas, não havendo, portanto, classes sociais nem luta de
classes. A propriedade é tribal ou comum e o trabalho se divide por sexo e idade. São comunidades no sentido pleno do termo, isto é, são internamente
homogêneas, unas e indivisas, nas quais todos se conhecem pelo nome, são vistos
uns pelos outros diariamente e possuem um destino comum.
A oposição e o conflito não se estabelecem no interior da
comunidade, mas em seu exterior, isto é, nas suas relações com as outras
comunidades, portanto, no que se refere à guerra e às alianças de sangue pelo
casamento.
Nelas o poder não se destaca nem se separa, não forma uma instância
acima dela (como o Estado, na política, ou como o chefe patriarca, no
despotismo). Existe chefia, porém, não é um poder de mando a que a comunidade
obedece. O chefe não manda; a comunidade não obedece. A comunidade decide por
si mesma, de acordo com suas tradições e necessidades, regulando por si mesma
conflitos pessoais entre seus membros.
Evidentemente, nossa tendência será dizer que essa organização é própria de povos
pouco numerosos e de uma vida socioeconômica muito simples, parecendo-nos, a
nós, membros de sociedades complexas e divididas em classes sociais, uma vaga lembrança utópica.
Pierre Clastres, porém, indaga: por que outras comunidades, mundo afora, não
foram capazes de impedir o surgimento da propriedade privada, das divisões
sociais de castas e classes, das desigualdades econômicas
do mercado que resultaram na necessidade de criar o poder separado, seja como
poder despótico, seja como poder político? Por que, afinal, os homens
sucumbiram à necessidade de criar o Estado como poder de coerção social?
Essas indagações estão na origem da filosofia política, que busca respostas para elas.
Finalidade da vida política
Para os gregos, a
finalidade da vida política era a justiça na comunidade.
Justo é o que segue a ordem natural e respeita a lei natural.
A posição dos sofistas
Para os sofistas, a polis
nasce por convenção entre os seres humanos quando percebem
que lhes é mais útil a vida em comum do que em isolamento. Convencionam regras
de convivência que se tornam leis, nómos. A justiça é o consenso quanto
às leis e a finalidade da política é criar e preservar esse consenso.
Se a polis e as leis são convenções humanas, podem mudar, desde que haja
mudança nas circunstâncias. A justiça será não só conservar as leis mas também permitir sua mudança sem que isso destrua a comunidade política, e a única
maneira de realizar mudanças sem destruição da ordem política é o debate para
chegar ao consenso, a expressão pública da vontade da maioria, obtida pelo voto
dos cidadãos reunidos em assembleia.
Platão
No final do século VI a.C., iniciou-se a "era de ouro" na
Grécia, a qual duraria duzentos anos.
No começo do período clássico, o povo da cidade-estado de Atenas
derrubou seu líder tirânico e instituiu uma forma de democracia.
Esse ambiente político rapidamente transformou Atenas num grande centro cultural,
atraindo alguns dos maiores pensadores daquela época.
A vida digna
O conceito de eudaimonia, a "vida digna", que era uma meta vital para os antigos gregos. “Viver bem” não era uma questão de
alcançar o bem-estar material, honra ou mero prazer, mas viver de acordo com virtudes fundamentais,
tais como sabedoria, piedade e, acima de tudo, justiça. O propósito do Estado, acreditava Platão, era
promover essas virtudes de modo que seus cidadãos pudessem levar essa vida
digna.
Na opinião de Platão, no entanto, não havia existido nenhum
sistema que cumprisse esse objetivo.
A razão disso, dizia Platão, é que os governantes, quer numa
monarquia ou oligarquia (o governo de poucos), quer numa democracia, tendiam a
agir segundo seus próprios interesses, em vez de pensar no bem do Estado e do
povo. Por
sua vez, induziam o povo a querer as coisas erradas, em especial os prazeres
transitórios da honra e da riqueza.
Com todos buscando um poder
maior, minam-se a estabilidade e a unidade do Estado. Quem for vitorioso na
disputa pelo poder priva os seus oponentes da possibilidade de alcançar os seus desejos, o que leva à injustiça — um mal que
é contrário ao alicerce da noção platônica de vida digna.
Em contraste, argumentava
Platão, existe uma classe de pessoas que entende
o significado da vida digna: os filósofos. Só eles reconhecem o valor das
virtudes sobre o prazer da honra e do dinheiro e devotaram suas vidas à busca
desse objetivo. Por essa causa, eles não anseiam a fama e a fortuna, não tendo,
assim, o desejo pelo poder político — de modo paradoxal, isso é o que os
qualificava como governantes ideais.
Formas ideais
Com Sócrates, Platão aprendeu que a virtude não é algo inato,
mas depende do conhecimento e da sabedoria, e, para viver de maneira virtuosa,
é necessário primeiro entender a natureza essencial da virtude.
Na sua Teoria das Formas.
Platão sugeriu que o que vemos como modelos de virtudes
seriam apenas exemplos dessas Formas e só
mostrariam uma parte de sua natureza. Seriam como reflexos inadequados ou
sombras das Formas reais.
As Formas ideais ou ideias, como Platão as chamava, existiriam numa esfera fora
do mundo onde vivemos, acessíveis apenas por meio do raciocínio filosófico e de
indagações. Isso é o que os filósofos especialmente qualificados fariam para
definir o que constitui a vida digna e leva a uma vida verdadeiramente
virtuosa, em vez de uma simples imitação de exemplos individuais de virtude.
Educando reis
Em seus diálogos posteriores, Político e As leis, descreveu
um modelo para um Estado no qual isso poderia ser alcançado, ensinando as
habilidades filosóficas necessárias para se entender a vida digna, assim como
outras úteis para a sociedade. No entanto ele chamou a atenção para o fato de
que nem todo cidadão teria a aptidão e a habilidade intelectual para aprender essas habilidades. Ele
sugeriu que, no caso em que essa educação
seria apropriada — para uma pequena elite intelectual —, ela deveria ser imposta
em vez de oferecida. Aqueles acolhidos para o poder devido aos seus "talentos
naturais" deveriam ser separados de suas famílias e agrupados em comunas,
garantindo sua lealdade ao Estado.
Platão tem sido criticado
como alguém que professou um sistema de governo
totalitário, ou pelo menos paternalista, governado por uma elite que alega
saber o que é melhor para todos os outros. Mais recentemente, no entanto, sua
noção central de urna elite política de "reis-filósofos" tem sido
reavaliada por pensadores políticos.
A posição de Platão
Para Platão, os seres humanos e a polis possuem a mesma estrutura.
Os humanos são dotados de três partes em suas almas ou três princípios de
atividade: a alma concupiscente ou desejante (situada nas entranhas ou
no baixo-ventre), que busca satisfação dos apetites do corpo, tanto os
necessários à sobrevivência como os que, simplesmente, causam prazer; a alma
irascível ou colérica (situada no peito ou no coração), que defende o
corpo contra as agressões do meio ambiente e de outros humanos, reagindo à dor
na proteção de nossa vida; e a alma racional ou intelectual (situada na
cabeça), que se dedica ao conhecimento.
Também a polis possui uma estrutura tripartite, formada por
três classes sociais: a classe econômica dos proprietários de terra,
artesãos e comerciantes, que garante a sobrevivência material da cidade; a classe
militar dos guerreiros, responsável pela defesa da cidade; e a classe
dos magistrados, que garante o governo da cidade sob as leis.
O que é, pois, o homem justo? Aquele cuja parte racional da
alma (pensamento e vontade) é mais forte do que as outras duas partes da alma. A justiça ética é a hierarquia das partes, a racional, superior,
que domina as inferiores.
O que é a justiça política? Essa mesma hierarquia, mas aplicada
à comunidade — os sábios legisladores devem governar, os militares,
subordinados aos legisladores,
devem defender a cidade, e os membros da classe econômica, subordinados aos legisladores, devem assegurar a
sobrevivência da polis.
Como realizar a cidade
justa? Pela educação dos cidadãos — homens e mulheres (Platão
não exclui as mulheres da política e critica os gregos por excluí-las). A cidade justa é governada pelos filósofos, administrada pelos cientistas, protegida pelos guerreiros e mantida pelos produtores.
Aristóteles
Diferentemente de seu
mentor Platão, Aristóteles acreditava que o conhecimento
era adquirido por meio da observação em vez do raciocínio
intelectual, e que a ciência política deveria ser baseada em dados empíricos, organizados de maneira parecida à taxonomia do
mundo natural.
· Taxonomia:
ciência ou técnica de classificação.
Naturalmente social
Aristóteles diz que "o homem é por natureza um animal
político". Com isso, simplesmente quer dizer que o homem é um animal cuja
natureza é a de viver em sociedade numa polis. O que está implícito é
que não há uma tendência natural para a atividade política no sentido moderno
da palavra.
Para ele, era inconcebível que os humanos pudessem viver de qualquer outro
modo. Isso contrasta com as ideias da sociedade civil como uma construção
artificial, tendo sido arrancada de um "estado de natureza" não
civilizado — algo que Aristóteles não teria compreendido. Qualquer um vivendo
fora de uma polis, acreditava, não era humano — podendo ser tanto
superior aos homens (ou seja, um deus) como inferior a eles (um animal
selvagem).
A vida
digna
Essa ideia da polis como um fenômeno natural, e não algo
feito pelo homem, sustentou as ideias de Aristóteles sobre a ética e a política
da cidade-estado.
A partir de seu estudo do mundo natural, ele aprendeu que tudo que existe tem
uma meta, ou um propósito, e decidiu que, para o homem, isso
seria levar uma "vida digna". Para Aristóteles, significa a busca por
virtudes tais como justiça, bondade e beleza. O propósito da polis, então,
seria nos capacitar a viver de acordo com essas virtudes. Os gregos antigos
viam a estrutura do Estado — que capacita as pessoas a viverem juntas e protege
a propriedade e a liberdade de seus cidadãos — como meios cujos fins eram a
virtude.
Espécies de governo
Enquanto Platão pensava teoricamente sobre a forma ideal de governo,
Aristóteles escolheu examina: os regimes existentes para analisar suas forças e
fraquezas. Para tal, levantou duas simples questões: quem governa e a favor de
quem se governa?
Como resposta para a
primeira pergunta, Aristóteles observou que existem basicamente três
tipos de governo: por uma única pessoa, por um grupo seleto ou por muitos. Como
resposta para a segunda pergunta, o governante poderia agir em favor da
população como um todo, o que ele considerava um verdadeiro ou bom governo, ou
em interesse próprio do governante ou da classe dominante, o que seria uma
forma defeituosa. Ao todo, ele identificou seis “espécies” de governo, em
pares. A monarquia é o governo por um indivíduo a favor de todos. O modelo por
um indivíduo em seu próprio interesse, ou tirania, é a monarquia corrompida. O
praticado por uma aristocracia (que para os gregos significava o feito pelos
melhores, em vez de um governo hereditário por famílias nobres) é o governo por
alguns em favor de todos. O governo por alguns em interesse próprio, ou
oligarquia, é a sua forma corrompida. Por fim, a politeia é o governo por
muitos em favor de todos. Aristóteles via a democracia como uma forma
corrompida desta última modalidade, já que na prática ela prevê o governo em
favor de muitos, em vez de em favor de cada indivíduo separadamente.
Apesar da tendência de Aristóteles de ver a polis como um “organismo” único, do qual
os indivíduos são apenas uma parte, ele também examinou o papel
do indivíduo na cidade-estado. Uma vez mais, ele enfatizou a inclinação natural
do homem para a interação social e definiu o cidadão como alguém que
compartilha a estrutura da comunidade social não apenas elegendo
representantes, mas pela participação ativa. Quando tal participação ocorre
dentro de uma forma de governo "boa" (monarquia, aristocracia ou
politeia), ela amplia a possibilidade do cidadão ter uma vida virtuosa. Sob um
regime "falho" (tirania, oligarquia ou democracia), os cidadãos se
envolvem com uma busca, em interesse próprio, do governante ou da classe
dominante — a busca do tirano pelo poder, a sede da oligarquia pela riqueza, ou
a busca dos democratas pela liberdade. De todos os possíveis regimes,
Aristóteles concluiu, a politeia prove a melhor oportunidade para levar a vida
digna. Apesar de Aristóteles categorizar a democracia como uma forma de regime
"falha", ele argumentou que ela só
perdia para a politeia, sendo melhor que a "boa" aristocracia ou
monarquia. Enquanto o cidadão individual talvez não tenha a sabedoria e a
virtude de um bom governante, coletivamente "os muitos" talvez provem
ser melhores governantes que "o único".
As ideias de Aristóteles tiveram uma influência crescente no
pensamento político europeu por toda a Idade Média. Seus argumentos a favor de
um governo constitucional antecipam as ideias
que emergiram no Iluminismo.
A posição de Aristóteles
Aristóteles elabora uma teoria política diversa da dos
sofistas e de Platão.
Para determinar o que é a justiça, diz ele, precisamos distinguir dois tipos
de bens: os partilháveis e os participáveis. Um bem é partilhável
quando é uma quantidade que pode ser dividida e distribuída — a riqueza
é um bem partilhável. Um bem é participável quando é uma qualidade indivisível,
que não pode ser repartida nem distribuída, podendo apenas ser participada — o
poder político é um bem participável.
Existem, pois, dois tipos
de justiça na cidade: a distributiva, referente
aos bens econômicos partilháveis, e a participativa, referente ao poder
político participável. A cidade justa saberá distinguir esses dois tipos de
justiça e realizar ambos.
A justiça distributiva consiste em dar a cada um o que lhe é
devido e sua função é dar desigualmente aos desiguais para torná-los iguais.
Suponhamos, por exemplo, que a polis esteja atravessando um período de fome em
decorrência de secas ou enchentes e que adquira alimentos para distribuí-los a
todos.
Para ser justa, a cidade não poderá reparti-los de modo igual para todos. De fato,
aos que são pobres, deve doá-los, mas, aos que são ricos, deve vende-los, de
modo a conseguir fundos para aquisição de novos alimentos. Se doar a todos ou
vender a todos, será injusta. Também será injusta se atribuir a todos as mesmas
quantidades de alimentos, pois dará quantidades iguais para famílias
desiguais, umas mais numerosas do que outras.
Enquanto Platão se preocupa com a educação e formação do dirigente
político — o governante filósofo —, Aristóteles se interessa pela
qualidade das instituições políticas (assembleias, tribunais, forma da coleta
de impostos e tributos, distribuição da riqueza, organização do exército,
etc.).
Com isso, ambos legam para
as teorias políticas subsequentes duas maneiras de conceber
onde se situa a qualidade justa da cidade: platonicamente, essa qualidade
depende das virtudes do dirigente; aristofanescamente, das virtudes das
instituições.
Ética e política
Se a política tem como finalidade a vida justa e feliz, isto é,
a vida propriamente
humana digna de seres livres, então é inseparável da ética. De fato, para os
gregos, era inconcebível a ética fora da comunidade política, pois nela a natureza ou essência humana encontrava sua realização mais alta.
Esse vínculo interno entre ética
e política significava que as qualidades das leis e do poder dependiam das
qualidades morais dos cidadãos. Somente na cidade boa e justa os homens podem
ser bons e justos; e somente homens bons e justos são capazes de instituir uma
cidade boa e justa.
A ascensão de
Roma
Enquanto isso, outra potência surgia na Europa. A República romana havia sido
fundada em torno de 510 a.C. com a derrota de uma monarquia tirânica. Uma forma
de democracia
representativa similar ao modelo ateniense foi estabelecida. Aos poucos,
criou-se uma constituição, segundo a qual o governo seria liderado
por dois cônsules eleitos anualmente pelos cidadãos, com um senado de
representantes para assessorá-los. Sob esse regime, a República cresceu em
força, ocupando províncias na maior parte da Europa continental. No entanto, no
século I a.C., conflitos civis se espalharam pela República por causa das
diversas facções que lutavam pelo poder. Júlio César assumiu o controle em 48
a.C. e se tornou imperador de fato, pondo fim à República. Roma, mais uma vez,
caiu sob um governo dinástico e monárquico, e o Império Romano dominaria a
maior parte da Europa pelos quinhentos anos seguintes.
Romanos; a construção do
príncipe
À medida que Roma se torna uma potência mundial, alguns
dos cônsules (Júlio César, Numa, Pompeu) reivindicam mais poder e mais
autoridade, que lhes vão sendo concedidos pelo Senado e Povo Romano.
Gradualmente, sob a aparência de uma república aristocrática, instala-se uma
república monárquica, que se inicia com Júlio César e se consolida nas mãos
de Augusto. Com este último, a monarquia vai perdendo o caráter republicano
até substituir o consulado, tornando-se senhorial, e instituir-se como Principado.
O príncipe é imperador. Por isso mesmo, vários pensadores
romanos republicanos consideram que a decadência política de Roma coincide com
o momento de seu maior esplendor econômico e militar, isto é, o Principado,
quando o nome "César" deixa de nomear a pessoa de Júlio César e passa
a indicar a posição do governante — o príncipe é um césar.
A mudança da República para o Principado ou cesarismo
transparece na teoria política. Embora esta continue afirmando os valores
republicanos — importância das leis, do direito e das instituições públicas,
particularmente do Senado e Povo Romano — a preocupação dos teóricos se mantém
voltada para a figura do príncipe.
Inspirando-se no
governante-filósofo de Platão, os pensadores romanos
produzirão o ideal do príncipe perfeito ou do Bom Governo. No
entanto, agora, a justiça dependerá das qualidades morais do governante. O príncipe
deve ser o modelo das virtudes para a comunidade, pois ela o imitará.
Na verdade, os pensadores
romanos viram-se entre duas teorias: a platônica, que
pretendia chegar à política legítima e justa educando virtuosamente os
governantes, e a aristotélica, que pretendia chegar à política legítima
e justa propondo qualidades positivas para as instituições da cidade, das
quais dependiam as virtudes dos cidadãos.
Entre as duas, os romanos
escolheram a platônica, mas tenderam a dar menor importância à organização política da sociedade e maior importância à formação do príncipe
virtuoso.
Virtudes principescas
Cícero insiste em que o verdadeiro príncipe é aquele que
nunca se deixa arrastar por paixões que o transformem numa besta. Não pode ter
a violência do leão nem a astúcia da raposa, mas deve, em todas as
circunstâncias, comportar-se como homem dotado de vontade racional. O príncipe será o Bom Governo se for um Bom Conselho, isto é, sábio, devendo
buscar o amor e o respeito dos súditos.
Referencias Bibliográficas:
KELLY, Paul. O livro da política, editora Globo, 2013, p. 12-15, 18-19, 28-31, 34-43.
CHAUI, Marilena. Filosofia: Novo Ensino Médio, Volume único. São Paulo: Ática, 2010, p. 237-246.
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