domingo, 5 de abril de 2015

EPICURO


Filósofo nascido na ilha grega de Samos em 341 a.C. Com longa trajetória em Atenas. Foi aluno da Academia, após a morte de Platão. É tradicionalmente apresentado como porta-voz maior do pensamento materialista. Hostil ao platonismo. Sua tese central é tentadora: a busca do prazer é condição e definição da própria felicidade.

Prazer e construção da ataraxia

O bem-estar, a tranquilidade do corpo e da alma, em grego ataraxia, deve ser vivido sempre que possível no instante presente. Mas para isso, é preciso algum investimento.

·  Ataraxia: ausência de inquietude, tranquilidade de ânimo, paz e imperturbabilidade de espírito
Se num momento você tem a sensação de que começou a chover na sua horta, saiba que, isto tem necessariamente a ver com a maneira como você viveu em momentos já vividos. Por outro lado, se o mar não estiver para peixe, não pense que as opções de outrora não tiveram nada a ver com isso.

Prazer e educação para a felicidade

Toda sabedoria deve se adequar à vida, à ética, e não o contrário. Afinal, pensamos para viver melhor, diz Epicuro. E não vivemos para pensar melhor.

Pensar, filosofar, é importante. Mas exclusivamente como meio para a vida. Para uma vida melhor. Porque permite viver melhor. E a vida feliz é o fim. O bem soberano. Aquilo que devemos e podemos alcançar. E que não pode ser meio para nada.

Prazer e morte

Na hora de cogitar sobre como gastar o tempo que resta, damo-nos conta de nossa pouca autonomia. Você dirá que deveria ser diferente. Mas não é. Como somos sociais — antes mesmo que você comece a esboçar alguma ideia sobre como viver — sua reflexão é atropelada por um turbilhão de propostas. Manifestações interessadas na sua adesão.

Apesar de todas essas sugestões para melhor distrair a existência, são muitas as ocasiões que nos relembram de nossa condição. Finita. Temporária. Daí toda nossa aflição. Nosso medo da morte. Que nos leva a invocar os deuses e outras entidades sobrenaturais. A atribuir-lhes a responsabilidade pelo nosso maior temor.

Sendo os deuses perfeitos e imortais, é contraditório que se preocupem com fluxos e impermanências. Mais ainda, que façam o mal para alguém. Aquele que é perfeitamente bom não causa dor ou tristeza. Nem como punição.

Temer a morte é temer algo que não existe para o homem. Impossibilitado de senti-la e conhecê-la. Experiência que escapa à condição humana.

Na física epicurista, herdeira de Leucipo e Demócrito, a realidade é constituída por átomos e vazio. E isto é tudo. Esse vazio permite aos átomos movimentarem-se. Todas as manifestações no mundo são redutíveis a esse movimento dos átomos. É a partir desta física que podemos entender uma ética de Epicuro.

O real todo ele atômico — só existe para nós a partir de informações que nos proporcionam os cinco sentidos. O mundo é o que vejo, o que ouço, o que cheiro, o que sinto etc. É a experiência que define o mundo para mim. E se tudo é átomo em movimento, a percepção que tenho do mundo também não passa disso.

São partículas atômicas, matéria fina, que se despregam do corpo observado e se chocam com os sentidos do observador. Assim, se neste instante estou vendo o computador é porque meus olhos estão sendo bombardeados de fragmentos desse computador.

Se há deuses, também são átomos em movimento. Estamos aqui bem longe das concepções de alma — eterna e imaterial — e de verdades absolutas.

Se todo o conhecimento e sensação provêm dos sentidos então o mundo em que vivemos é o mundo que sentimos.
O que já vinha deixando de ser durante a vida, deixa de ser de uma vez.

Uma vez mortos — ainda que a matéria que nos constituía tenha nos traído na constituição de outros corpos — não podemos usar nossos sentidos. Não estamos mais vivos para sentir o mundo. Desaparece toda sensação.

Pois bem. Se todo prazer e dor provêm da sensação, o fim da vida não pode ser nem agradável, nem desagradável. Por isso, é tolice temer a morte. Preocupar-se com a morte, portanto, é não viver a vida. É renunciar a felicidade em ato.

Portanto, o mal que nos faz ter arrepios, ou seja, a morte, é nada para nós, a partir do momento que, quando vivemos, a morte não existe. E quando, ao contrário, existe a morte, nós não existimos mais. A morte, portanto, não se refere a nós, nem quando estamos vivos, nem quando estamos mortos, porque para os vivos ela não existe, e os mortos, ao contrário, não existem mais. Os outros, por sua vez, fogem por vezes da morte como do pior dos males; outras vezes a procuram como alívio das desgraças da vida. O sábio, ao invés, nem rejeita a vida, nem teme o não viver mais; com efeito, a vida não lhe é molesta, e ele também não crê que a morte seja um mal” (EPICURO. Carta a Meneceu).

Prazer e tipos de desejo

O filósofo sugere que trabalhemos nossos desejos. Porque são eles que estão na origem do nosso sofrimento.

“É por isso que nós dizemos que o prazer é o princípio e fim último da vida feliz. Nós sabemos que ele é o nosso bem primeiro e congênito; dele partimos em qualquer ação de escolha e de rejeição, e a ele nos reportamos ao julgarmos todo bem como base nas afeições assumidas como norma” (EPICURO. Carta a Meneceu).

Para Epicuro, existem três tipos de desejo. Desejos naturais e necessários. Desejos naturais e não necessários. Desejos não naturais e não necessários. A felicidade possível tem a ver com o tipo de desejo que você se dispuser a satisfazer.

O desejo será natural quando for comum aos animais. Quando eu desejo, sinto uma inclinação do corpo acompanhada de algo que passa pela minha cabeça.

O desejo será necessário quando — caso não satisfeito — nos leve à morte. Assim, de acordo com Epicuro, beber, comer e dormir são os desejos que atendem às condições de naturalidade e de necessidade.

A satisfação desses desejos deve ser realizada da forma mais singela possível.

Desejamos sexo. Mas, segundo Epicuro, não morremos na sua abstinência.

A teoria hedonista de Epicuro se diferencia das concepções moderna e pós-moderna de hedonismo. De acordo com a primeira, a moderação é fundamental para uma vida sadia. Os excessos face aos desejos naturais e necessários de comer, beber e dormir, resultam de um descontrole do corpo e do espírito frente às paixões. Denunciam uma potencial tristeza.

Quanto aos desejos não naturais e não necessários, satisfazê-los, nem pensar. São exclusivos do homem e, se não satisfeitos, não levam a morte. Isto porque, tudo aquilo que não é natural não deve ser considerado como essencial. Não faz parte do projeto original da natureza e por isso mesmo não nos faz feliz.

Nada que não seja essencial para viver serve para a felicidade.


Referência Bibliográfica:

DE BARROS FILHO, Clóvis. A vida que vale a pena ser vivida. Editora Vozes, 2010.



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